Se há um tema que muito me incomoda é esse da reforma política brasileira. Vejo muita hipocrisia nas discussões sobre o assunto, já que uma reforma política verdadeira deve acabar com privilégios, com a corrupção e com os desvios de dinheiro público que beneficiam os poderosos.
A realidade política brasileira ironicamente me faz lembrar a época do Brasil Colônia, revelando uma sociedade dividida entre os poderosos e o povo que lhes servia. De um lado, a “Casa Grande”, com toda espécie de mordomias. Ou seja: um salário de R$33,7 mil mensais, auxílio moradia de R$4,2 mil, cotas de R$30,2 a 44,9 mil para passagens, telefones, correios e fretamento de aeronaves, verba de gabinete de R$92 mil para contratação de 25 funcionários em cargos de confiança, reembolso de gastos com tratamento de saúde, veículo particular de luxo, dentre outros. E bem distante desse paraíso terrestre, encontra-se a Senzala, da qual faz parte a maioria do povo brasileiro, que luta muito para sobreviver apenas com o salário que recebe, inclusive, pagando altos impostos para sustentar as mordomias de nossas autoridades.
Uma reforma política verdadeira deve corrigir tais injustiças. Não é possível pensar em democracia, sem um tratamento justo para todos. Enquanto existir privilégios para alguns, com o país gastando anualmente cerca de R$ 23 milhões por dia para manter as mordomias dos 513 deputados federais e dos 81 senadores, o discurso em favor da democracia não passará de uma arte retórica, pois sua prática continuará produzindo uma maioria de injustiçados.
Partindo desse princípio, é possível pensar algumas propostas, passando pela democratização interna dos partidos, o fim do voto obrigatório, um mandato de cinco anos para todos os cargos e apenas uma reeleição para os cargos do legislativo brasileiro. Não há como pensar no exercício democrático, sem que os partidos políticos mudem seus critérios na indicação de seus candidatos. Normalmente, a escolha dos que disputam cargos para o executivo e o legislativo é feita pela cúpula partidária, prevalecendo, nesse caso, a vontade do mandatário maior.
Outro ponto importante a ser considerado, no processo de redemocratização do país, seria o fim do voto obrigatório. É preciso respeitar o direito do cidadão de querer ou não querer votar. Enquanto ele for obrigado a isso, será impedido de exercer livremente sua liberdade. Votar, de acordo com o princípio democrático, deve ser opção e não obrigação.
A unificação do processo eleitoral e a mudança na duração do mandato, de quatro para cinco anos, sem a possibilidade de reeleição, para o executivo, seria uma forma de amadurecimento democrático, uma vez que daria condições a essas autoridades de administrarem, sem se preocuparem com artimanhas políticas, visando à reeleição. Do mesmo modo, a possibilidade de uma só recondução aos cargos do legislativo reduziria as chances daqueles que fazem da política um balcão de negócios para a perpetuação no poder e manutenção de privilégios.
A reforma política, portanto, será verdadeira, se corrigirem essas distorções, principalmente se cortarem privilégios. Do contrário, será mais uma encenação para ludibriar ainda mais o cidadão de bem, que não mede esforços e luta muito para honrar seus compromissos na expectativa de construir uma sociedade melhor, justa e democrática, para todos.
José Doniseti da Silva – Professor de Língua Portuguesa, Redação e Literatura Brasileira, escritor e poeta. Blog:donisetiprofessor. bolgspot.com